Yorranna Oliveira

Achei a imagem aí de cima pesquisando no Google. E ela define perfeitamente um pouco do que eu sou e da proposta do blog: tem de tudo um pouco, e um pouco de quase tudo o que gosto. Aqui você vai encontrar sempre um papo sobre música, cinema, comunicação, literatura, jornalismo, meio ambiente, tecnologia e qualquer outra coisa capaz de me despertar algo e a vontade de compartilhar com vocês. Entrem e divirtam-se!

domingo, 4 de março de 2012

O recomeço possível

A vida é uma sucessão de abandonos. Escolhidos ou não. Pode até parecer um olhar pessimista sobre a existência, mas se você parar, pensar e refletir a respeito essa ideia não deixa de ter semelhanças com a realidade. Em “O garoto da bicicleta”, dos irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne, o jovem Cyril jamais optaria ficar sem o pai (Jeremie Renier). Só que Cyril não teve escolha. O pai quis assim e o abandonou num internato com a promessa - implícita no filme – de resgatá-lo depois de um mês, quando então poderia ficar com o filho. Ele não volta. E Cyril ainda não acredita, mesmo diante de tudo aquilo que comprova que ele o deixou. A mudança de endereço sem aviso. A troca do número de telefone. A ausência de notícias.

O fio de esperança que mantém vivo em Cyril a possibilidade de retorno ao mundo paterno é uma bicicleta, ainda, como ele acredita, sob a posse do pai. Os dias parecem seguir lentos e a promessa de resgate não se cumpre. O que faz o garoto atormentar a todos e a si mesmo numa caçada à procura do pai, que não o quer na nova vida, planejada sem o filho - para ele um verdadeiro empecilho. O homem se muda, vende tudo, até mesmo a bicicleta do menino. Cyril não acredita. O objeto ao menos ele entregaria.

Quando o jovem recupera o brinquedo, ele vai pouco a pouco descobrindo a própria brutalidade do destino. E não aceita isso. Aos 11 anos de idade, ele briga com todos ao redor, numa violência que explode até mesmo contra aqueles que o acolhem e tentam cuidar dele, como a guardiã dos finais de semana – a cabeleireira Samantha (Cécile de France) -, ferida numa luta para impedir o garoto de cruzar um outro caminho e terminar a destruição de uma vida já estilhaçada pelo única referência de família.

É Samantha, inclusive, quem o ajuda a localizar o pai. No entanto, ele não aparece no encontro marcado com o filho. Cyril mais uma vez se nega a receber a visita cruel da concretude do abandono. Os dois o encontram no novo emprego. A frieza paterna marca a recepção do rapaz, que não se cansa de tentar alternativas de ficar novamente ao lado do pai. Covarde, o homem mente para o filho e faz novas promessas das quais ele será incapaz de cumprir. A cabeleireira age e não aceita outras mentiras. É nesse instante que o filme alcança a imensidão da dor e do desespero. Sensações compartilhadas pelo espectador que não consegue ficar insensível à cena e vivencia os mesmos anseios de Cyril. Como se algo internamente em cada um também se partisse. Se despedaçasse sem a menor possibilidade de recuperação. Como se já tivesse sido feito para acabar.

Vencedor do Grande Prêmio do Júri em Cannes em 2011, juntamente com ‘Era Uma Vez na Anatólia’, de Nuri Ceylan, “O garoto da bicicleta” até dia 11 de março no Cine Estação das Docas.


O Garoto da Bicicleta (França, 2011). Direção e roteiro: Jean-Pierre e Luc Dardenne. Com Cécile de France e Thomas Doret. Dias de exibição em março: 08 (quinta), às 18h e 20h30, 09 (sexta), às 18h e 20h30, e 11(domingo), às 10h, 18h e 20h30. Ingressos: R$ 7 (com meia-entrada para estudantes). Realização: OS Pará 2000, Secretaria de Estado de Cultura – Secult e Governo do Estado.

(Texto publicado originalmente no jornal Diário do Pará)

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