Yorranna Oliveira

Achei a imagem aí de cima pesquisando no Google. E ela define perfeitamente um pouco do que eu sou e da proposta do blog: tem de tudo um pouco, e um pouco de quase tudo o que gosto. Aqui você vai encontrar sempre um papo sobre música, cinema, comunicação, literatura, jornalismo, meio ambiente, tecnologia e qualquer outra coisa capaz de me despertar algo e a vontade de compartilhar com vocês. Entrem e divirtam-se!

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

A essência musical de um compositor apaixonado

Vicente Fonseca nem tinha 10 anos completos, quando em 1958 fez sua primeira canção, a valsa Experimentar. Dedicada ao tio Wilmar, a música integra um acervo com mais de 800 composições, feitas ao longo dos 50 anos de carreira do compositor santareno.

Neto e filho de compositores, o músico herdou o dom e o gosto natural pela arte. Desde muito cedo, ele respirou as notas musicais em sua vida. Aos três, quatro anos já brincava no piano da família. A convivência diária com o pai e os tios – todos músicos – , inevitavelmente, despertou a paixão do menino.

"Tudo começou com meu avô paterno, José Agostinho da Fonseca (1886-1945). Ele estudou no Instituto de Educandos Artífices (atual Instituto Lauro Sodré), em Belém, e também com o Maestro Paulino Chaves. Ao passar umas férias em Santarém, lá ficou, porque se apaixonou por uma jovem (Anna), que se tornou minha avó, para quem ele compôs a sua primeira música, o schottich Idílio do Infinito (1906), considerada a primeira composição escrita na Pérola do Tapajó", explica.

A tradição musical, iniciada pelo avô, proporcionou a Fonseca desenvolver naturalmente o talento herdado. O pai, Wilson Fonseca, foi seu principal mentor. Na casa da família, em Santarém, o maestro Isoca – como era conhecido -, organizava sessões lítero-musicais, onde Vicente ganhava os subsídios para sua formação. Com o maestro, aprendeu tudo sobre a técnica da Euterpe, além de ter contato com os clássicos da música erudita. Não é à toa que Vicente Fonseca nutra grande admiração pelo mestre e iniciador.

Trajetória
"Sempre procurei divulgar a obra musical de meu pai (1.600 peças, do popular ao erudito), assim como ele fez com meu avô. Essa é uma autêntica missão de vida para mim. Minhas próprias produções ficaram, por muito tempo, guardadas na gaveta. Ele era meu mestre na arte e na vida. Quando morreu em 2002, compus a Lira Iluminada (Valsa Santarena nº 51) em sua homenagem", destaca.

Na juventude, o compositor participou de festivais de música, integrou conjuntos e bandas musicais, dirigiu corais. Cada minuto era aproveitado para realizar o sonho de infância: ser maestro. Para isso, o pianista se utilizava dos ensinamentos domésticos do pai, somados a muita leitura, audições e a vivência do cotidiano. No entanto, as linhas tecidas pelo destino o conduziram para outro caminho, a magistratura, profissão desempenhada até hoje, no auge de seus 60 anos.

Quando ainda era universitário de Direito, ele fez um rápido curso de harmonia com o maestro Francisco Mignone, em Belém. Durante os anos de 1962 e 1963, participou de um intensivo no Conservatório Musical José Maurício, dirigido pelas professoras Rachel e Gioconda Peluso. Mas até hoje, Vicente estuda e escuta muita música, especialmente no gênero erudito.

"Sou quase autodidata na arte musical. Pertenço à terceira geração de músicos família Fonseca. Sou essencialmente músico, está no sangue e na alma. Meus tios, irmãos, primos, sobrinhos e filhos tocam, compõem, fazem parte de alguma orquestra ou tocam em algum grupo musical. O maestro João Carlos Martins comparou a nossa família a de J.S. Bach, da Alemanha, pela tradição cultural transmitida aos descendentes", diz.

Indo ao povo
Depois de ingressar na magistratura. em 1973, a atividade musical ficou mais reduzida, jamais abandonada. Com o tempo, encantou-se pela magistratura trabalhista e conseguiu conciliar os dois amores ao magistério. Tanto que incorporou inteiramente um ao outro. Para ele suas escolhas se completam. Fato facilmente constatado pelas incursões musicais na área profissional. Vicente foi um dos fundadores e dirigentes do Coral da Justiça do Trabalho, além de escrever os hinos da Justiça do Trabalho, da Justiça Eleitoral, do Tribunal de Justiça do Estado do Pará entre outros.

"O ingresso na magistratura é opção profissional da maturidade, com pouco tempo de formado em Direito. Não vejo a menor dificuldade de conciliação, o segredo é gostar do que se faz e particularmente gosto de tudo o que faço", afirma.

A música, contudo, tem papel especial na vida do magistrado. Muito anterior à profissão, ela trouxe o bem-estar e qualidade de vida, além da possibilidade de conhecer pessoas, repartir o prazer de fazer e executar sua arte. "É um modo de viver, de ser, se sentir e de agir, em harmonia. Em Santarém, por exemplo, toquei, já na condição de juiz, em companhia de pedreiro, alfaiate e outros operários humildes. Mas, naquele grupo musical não estava o magistrado, mas o executante de sax-horn e barítono. Sinto saudade daquele tempo", revela.

Autor de extensa obra musical, o catálogo do trabalho do artista abrange os mais variados gêneros. Apesar da tendência erudita, Fonseca mescla o popular e a diversidade sonora da Amazônia em suas produções. Ele registra peças para canto, coral, piano, violão, câmara, banda, orquestra etc. Compôs canções, valsas, chorinhos, sambas, marchas, bossa-nova, hinos. sonatinas, peças sacras, trios, quartetos e quintetos de cordas e de sopros. "A boa música não se prende a estilos. Certa vez me perguntaram a qual corrente musical eu me prendi, respondi sem hesitar: Considero-me essencialmente um compositor brasileiro e amazônico", conta.

Cores do arco-íris
Suas composições já foram apresentadas por artistas eruditos do Brasil e do exterior em diversos concertos e eventos ao longo dos anos. Como intérprete ele destaca cinco momentos marcantes da trajetória. Mas de todos, recorda com carinho da primeira audição de parte da Sinfonia do Tapajós (4º movimento - Oração: Ave Maria), de sua autoria. A data era 17 de novembro de 2006 – data de aniversário do pai –, na Casa da Cultura, em Santarém.

No concerto, apresentado pela Orquestra Sinfônica do Theatro da Paz, foram executadas as composições das três gerações da família Fonseca. Inclusive o arranjo orquestral teve elaboração dele, especialmente para aquela ocasião, para a música "Canção de Minha Saudade" (1949), composta por Wilson Fonseca, com letra do tio Wilmar Fonseca (1915-1984). "Costuma-se dizer que para alguém provar ser mocorongo, nem precisa exibir a carteira de identidade ou a certidão de nascimento; basta saber cantar esta bela canção. Simplesmente, inesquecível!", ressalta.

Como fonte inspiração, o pianista e compositor se alimenta do amor pela família e da saudade da terra natal, Santarém. Ele compõe sob diversas circunstâncias. Segundo o artista, não há hora certa para compor. O tema de uma canção surge como "toque de mágica". Ainda de acordo com ele, a música já encontra no texto poético, basta existir a sensibilidade de tornar isso explícito. "O ato de compor me parece tão espontâneo, intuitivo e vital que nem me dou conta do que acontece. De repente, a música ou a letra está criada. Surge de uma fagulha de inspiração", opina.

Compor também simboliza uma forma de homenagear as pessoas e queridas e as homenagens a ele concedidas. Recente, Vicente Fonseca compôs Ritual Sinfônico para os formandos da turma de 2008 de Bacharelo em Música, da Universidade do Estado do Pará, como retribuição ao convite para ser patrono dos alunos. "Sempre retribuo em forma de música, é melhor maneira de agradecer", aponta.

Outra homenagem, no campo mais íntimo, já entrou na coleção de Fonseca, a música "Samba do Arco-Íris", dedicada aos dois anos do neto. "Ele, além de revelar vocação musical, já conhece as principais cores, números e letras. Enfim, como digo na letra deste sambinha: 'No teclado preto e branco/Vou levando por aí/Meu sambinha colorido/Dó, ré, mi, fá sol, lá si.//Com as cores do arco-íris/Vou pintar esta cantiga/Pelas ruas da cidade/No retorno à moda antiga'", compôs o avô coruja.

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